sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O pecado da curiosidade



Há séculos a curiosidade foi tratada como pecado, muitas vezes, ainda hoje surpreendemo-nos com certo sentimento de vergonha, curiosos por algum assunto; é o resultado de anos de treinamento ao conformismo; ao longo da história temos exemplos de buscadores da sabedoria que foram perseguidos, martirizados ou presos, como Galileo Galilei, que além de preso foi condenado a abjurar, ou seja, voltar atrás em suas afirmações (sobre a questão do heliocentrismo). Também digna de consideração é a questão de qual é o foco de nossa curiosidade, ou ainda melhor, qual sua intenção; para o direito a intenção é algo a ser sempre avaliado, o que determina dolo ou culpa; aplicado ao nosso assunto diria que determina seu caráter, é como a diferença entre o psicanalista, que buscando nos detalhes do cotidiano do indivíduo tenta estabelecer aspectos da personalidade parar poder determinar um auxílio, e o fofoqueiro, que apontando defeitos talvez nem existentes procura julgar-se superior pela inferiorização do próximo.
No estudo da curiosidade e do pecado vejo-me impelido a considerar o pecado original, na tradição bíblica, aquele cometido por Adão e Eva causando sua exclusão do paraíso; não tenho aqui a pretensão de dar a última palavra em interpretação desse texto, mas apenas dar uma das minhas interpretações; acho bastante razoável identificar esse como sendo um pecado de curiosidade; eles, os ancestrais primevos, se viram curiosos, podiam falar com Deus e com a natureza, mas não podiam ter o conhecimento do bem e do mal, esses devaneios me levam a contemplar a questão do ser como o menino para poder entrar no reino dos céus, ou seria para poder voltar ao paraíso? Podemos admitir por analogia que Adão e Eva podiam alimentar-se de todo o conhecimento disponível naquele universo (jardim), entretanto jamais do fruto da árvore da ciência do bem e do mal, que fruto será esse?
Hoje entendemos que curiosidade é olhar à frente, buscar evolução; sempre lembrando que não existe lei nova no universo apenas novos entendimentos possíveis pela evolução da consciência humana, basta observar o versículo 21 do capítulo 5, da primeira epístola de São Paulo aos tessalonicenses: Examinai tudo, retende o que é bom. Portanto onde acreditávamos haver o pecado da curiosidade percebemos que existia somente nossa própria consciência submetida a entendimentos dogmáticos alheios, assim tentemos eliminar de nossas consciências preconceitos e medos, foquemo-las em curiosidades sadias e deixemos o dom maior de Deus manifestar-se em nossas vidas, a própria consciência.

Osculum Pacis !

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Deus é Laico



Contribuição do amigo JD Lucas, a quem agradeço por me confiar esse texto.

A religião foi a maneira que o homem primitivo encontrou para lidar com suas questões sem solução, um impulso surgido da necessidade de um aspecto transcendente operando por trás da realidade. Em princípio, os deuses assumiam formas ou manifestavam-se através dos aspectos naturais, e todo o paganismo deriva dessa disposição. Adiante, com a sofisticação da escrita em decorrência da criação de códigos sociais — que ampliou a interação entre dois sujeitos que compartilhavam o mesmo sistema linguístico — aqueles mais letrados passaram a impor sua religião como única, ou mais aceitável, associando o valor do sentimento religioso proporcionalmente ao valor do conhecimento adquirido sobre a natureza. O preço dessa operação foi morte do mito, ou sua imersão no desconhecido. 
Todos os fatos, acontecimentos e por quês advém, no entanto, da mesma raiz comum a homens e mulheres, e o mito é uma realidade inerente a todo ser. A substituição do paganismo em grande parte do ocidente por uma religião de credo monoteísta surge para agrupar aqueles aspectos naturais que antes tinham vontade e personalidade própria, para formar um todo ultra-consciente que conecte tantos aspectos errantes numa mesma unidade conceitual. Assim, você tem a destruição de milhares de deuses em troca do nascimento de um apenas-Ele, responsável desde já, pela fundação da realidade, como se outros deuses nunca tivessem existido ou não tivessem importância. Então, a consolidação do monoteísmo no ocidente, à medida que o homem adquire e quantifica conhecimento sobre si, é ele mesmo símbolo dessa unificação de aspectos díspares de influência da natureza em um só aspecto permeando todas as coisas. Uma só lei, Uma só causa. 
Com o advento do cristianismo, um novo e importante dado é acrescentado, e vem transformar pra valer a concepção de divindade. Sendo um desdobramento daquela essência una, Cristo é o Deus feito carne, um homem por todos os homens, o que leva a informação mitológica do herói (Hércules, Odisseu, Ajax... pra citar os gregos) novamente às alcovas, onde mais se carece de uma intervenção divina; Dalí, a informação se espalha e, com o acréscimo gradativo dos aspectos míticos gerado pelo boato (milagres, sabedoria, ascendência divina...) temos um mito que surge forte o suficiente pra desbancar divindades muito antigas, como o Mitra grego ou o Hórus egípcio. Valendo-se de estratégias humanamente sagazes e simples, o corpo do que seria mais tarde a igreja católica, associa aspectos míticos de outras crenças no intuito de criar identificação com as pessoas, que carentes de espelhos transcendentais, volta-se para o absolutamente novo filho de deus.
A humanidade atinge dessa forma, com a ascensão crística, um valor que a própria concepção política da Igreja não pode prever. A ideia de que cada um, em sua individualidade, tem capacidade e competência para realizar-se de forma plena. Simbolicamente, é como se, com a ascensão de Cristo, Deus também tivesse deixado pra trás os templos, e postulasse que só vivendo inteiramente a própria individualidade e retirando-se de toda mediocridade de pensamento e ação, será possível alcançar o Céu, ainda que todo erro e ilusão sejam necessários. Prova disso é que no relato do mito da crucificação, Cristo exprime, perplexo: “Meu deus, meu deus, por que me abandonaste?”, como um ato tardio de dúvida que o torna humano. Foi abandonado na cruz, desfeita toda sua ilusão. A resposta transcendente à sua realização é a ascensão em corpo e espírito aos céus, a ressurreição propriamente dita.
Ninguém pode afirmar de fato se Jesus existiu, ou sobre os milagres que realizou, mas por haver um Cristo, quer dizer, um Salvador associado ao sentimento religioso do mundo, um mito tão atuante sobre a auto-realização aponta principalmente para o fato de que deus, a mônada, não está preso ao templo ou à filosofia, sequer está preso a algo, quer sejam as concepções mais restritas ou libertárias. Pra realizar-se plena e satisfatoriamente, o conceito ultrapassa toda limitação, inclusive as lingüísticas, e se estabelece para além do discurso, muito além, para dentro.
Então esse texto atinge o máximo de sentido que pode atingir e termina.

Tolerância, opinião e sabedoria


Ter opinião parece uma exigência, devemos concordar ou discordar, devemos gostar ou não, achar bom ou ruim, mas porque temos essa obrigação? Arrisco dizer que é por conta de vivemos na era da informação e, como todos temos a informação, devemos fazer algo com ela, tomarmos partido. Talvez tenhamos uma ou duas alternativas, talvez possamos simplesmente entender que não dispomos de informação suficiente para tomar alguma decisão, ou talvez possamos dizer que, e eu digo isso sempre, agora eu entendo assim, mas posso mudar completamente de ideia daqui a um momento; com essas informações chego ao assunto do respeito a opinião alheia.
Tolerância não é um termo que acredito adequado ao assunto, quem tolera é de alguma forma superior, permitindo que algo inferior se manifeste; prefiro entender que devemos é respeito e consideração, respeito porque a opinião alheia foi gerada a partir da experiência pessoal do indivíduo, e esse individuo tem o mesmo direito que nós ao seu próprio entendimento; consideração porque essa experiência pessoal pode ser tão ou mais interessante que a nossa própria, por isso devemos considerar e sermos serenos ao tomar nossas posições em relações a assuntos delicados, principalmente quando em discussão que pode atingir pessoalmente outrem; quem fala pouco erra pouco, esse é um adágio comprovadíssimo, portanto aconselho que sejamos modestos, evitando tomadas ostensivas e definitivas de posição, podemos mudar e opinião e então estaremos presos pela palavra, por nosso próprio ego que tenta nos impedir de voltar atrás, lembro as palavras do evangelista Mateus, no versículo 11 do capítulo 15 de seu livro: "O que contamina o homem não é o que entra pela boca, mas o que sai da boca, isso é o que contamina o homem". Outra questão interessante é que essa serenidade não deve ser confundida com apatia, não devemos ficar "em cima do muro", existem situações que demandam posição, ação, resposta imediata, é aí que devemos ter sabedoria, resolvendo os assuntos de forma a possibilitar que eles permaneçam resolvidos e não se tornem outros problemas.