quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A Estrada e o Mestre

Eia aqui amados mais um texto atribuído ao antigo sábio Drol Redaj, há rumores de que este talvez seja obra de um de seus discípulos e não do próprio mestre*, mas vale a pena dar uma lida. PAZ !

" É difícil precisar o momento exato em que se começa a caminhar por uma estrada, existem diversos acontecimentos que servem como marco para definirmos um ponto cronológico que indique o início de nosso caminhar, contudo quando cotejamos os momentos anteriores à essas marcações observamos que já em diversas ocasiões manifestávamos os sinais característicos do caminhar e identificávamos as sutilezas da estrada, e que mesmo não sabendo conscientemente o que estávamos fazendo, sentíamos no mais profundo de nosso ser que este era o caminho certo a se seguir, mesmo que a grande maioria das pessoas ao nosso redor caminhasse em uma direção claramente oposta.
Quando comecei a caminhar não sabia exatamente aonde ia, nem a razão de estar indo. A única coisa verdadeira que sabia, ou julgava saber, era que os caminhos que via os outros percorrerem não possuíam nem um tipo de atrativo que me levasse a querer seguí-los. As paisagens desses caminhos pareciam desprovidas de propósito e significado. A estrada parecia curta demais. Se apresentava sem aquele brilho misterioso que enxergamos em algo cuja magnificência transcende a nossa ínfima compreensão. E assim, talvez direcionado por algum desejo interno verdadeiro, e forte o suficiente para transmutar a quimera que chamamos de realidade, ou talvez por pura sorte, comecei a caminhar por essa estrada.
Foi algo único. Não há palavras na sublime linguagem humana que possa descrever com perfeição o sentimento arrebatador que nos envolve quando compreendemos que finalmente encontramos a verdadeira estrada, tão pouco é possível verbalizar a divina sensação que lentamente cresce em nossa consciência quando estamos à percorrê-la.
Para mim o início foi solitário. Caminhava observando tudo que se apresentava a minha limitada visão. Algumas coisas que vi somente depois de passado longo tempo pude verdadeiramente compreender, outras, não sei se por falha minha ao interpretá-las, ou, talvez, em percebê-las, confesso que ainda hoje não compreendo. Mas caminhei. Dediquei-me de corpo e alma a estrada e ao caminhar, pois buscava lograr o grande premio que diziam aguardar ao final todos aqueles que por essa estrada passavam.
Diziam que um grande sábio habitava no final da estrada e que todo aquele que lá chegasse poderia receber ensinamentos desse grande mestre.
Assim prossegui caminhando sozinho e observando, até que em determinado momento encontrei outro caminhante. Era alguém como eu. Nunca o havia visto antes, mas sentia que dele se irradiava algo que o distinguia dos outros, algo intrínseco ao caminhante dessa, misteriosamente desenvolvido que se torna perceptível aos outros viajantes. Sem saber como, eu sabia... ele era meu irmão.
Juntos percorremos grande parte do caminho nos entretendo com as maravilhas que a estrada oferece. Em alguns momentos ele demonstrava nítida comoção com detalhes que aos meus olhos eram apenas interessantes, em outros eu me encantava e expressava de forma eufórica a sublimidade de coisas que para ele talvez não fossem tão expressivas. Mas caminhamos, juntos caminhamos até que a estrada apresentou uma bifurcação. Pensativos paramos e começamos a analisar qual dos dois seria o caminho correto a se seguir. Meu irmão depois de muito meditar e refletir achou por melhor seguir o caminho da esquerda, enquanto que eu, seguindo a voz que lentamente começou a se manifestar dentro de meu ser, segui o da direita.
Enquanto andava recomeçando o meu caminhar, novamente sozinho, olhei para trás para ver mais uma vez meu irmão, e percebi que ele naquele exato momento transpassava um enorme buraco que havia no caminho da esquerda pelo qual ele seguiu. Preocupei-me, mas segui. Caminhei.
Muitos foram os dias que andei, muitas foram as paisagens que pude contemplar. Por diversas vezes tive que pular uma ou duas pedras que se apresentavam no meu caminho, mas ainda assim segui. Segui até que finalmente pude vislumbrar o que buscava. Ao longe, lá no fim, sentado em uma pedra estava o grande mestre, ele me aguardava.
Ele acenou para mim e sorriu. Eu emocionado por ter alcançado a graça de encontrá-lo corri ao seu encontro. Quando me aproximei ele disse:
- Meu filho, finalmente chegaste!
Eu estava ali diante do grande mestre e no entanto tudo em que conseguia pensar era em meu irmão, pois ele tomara o caminho errado.
O mestre que enxergava muito além do que é possível mensurar percebeu que havia algo de errado comigo e questionou:
- O que lhe aflige meu filho?
Eu disse então.
- Mestre meu irmão que caminhava comigo tomou o caminho errado, por favor me aguarde enquanto eu retorno para buscá-lo.
O mestre riu inocentemente e disse:
- Não meu filho, ele não tomou o caminho errado. Ele tomou o caminho certo. Também estou ao final daquele caminho aguardando que ele chegue até mim.
Minha mente mesmo tendo se modificado em relação ao que era quando comecei a trilhar a estrada não conseguia entender, assim perguntei:
- Mas mestre o senhor está aqui, como pode também estar lá?
E o mestre me respondeu.
- Meu filho, eu estou em todos os lugares é preciso apenas querer me enxergar.
Ainda inconformado questionei:
 Mas mestre eu notei que o caminho que meu irmão tomou possuía diversos buracos, como pode aquele ser o caminho correto para levar até o senhor?
E o mestre sorrindo me disse:
- Meu filho, da mesma forma seu irmão notou as diversas pedras que haviam no caminho que você seguiu, e por isso ele escolheu seguir pelo outro. Para ele é mais fácil ultrapassar buracos que pular pedras, enquanto que para você é o oposto.
Como todo aquele que ainda não detém o entendimento insisti:
- Mas senhor se ele viesse pelo caminho que eu vim eu o ajudaria a transpor as pedras e ele à mim, o caminho seria mais fácil para nós dois.
- Não meu filho, - disse o mestre - o caminho nunca é fácil. Mesmo que ele viesse com você, ou você fosse com ele a estrada se mostraria diferente para cada um. Aonde ele visse um buraco, talvez você visse uma pedra. Aonde ele visse uma passagem estreita, talvez você visse uma passagem larga e vice-versa, pois a estrada meu filho, é diferente para cada um e o caminhar também o é. Enquanto em alguns momentos ele quisesse andar mais rápido, talvez você quisesse andar mais lento. Quando você quisesse continuar caminhando, talvez ele quisesse parar e descansar. Assim é essa estrada. E cabe a cada um descobrir o seu caminho e o seu caminhar.
Um facho de compreensão atravessou-me e pude finalmente contemplar uma parcela da verdade. Maravilhado com isso agradeci ao mestre:
- Obrigado mestre. Obrigado por ter aberto meu entendimento para isso.
E o mestre com o olhar mais piedoso que já contemplei nessa encarnação, e a voz mais terna que já tive a oportunidade de ouvir me disse:
- Não meu filho, agradeço-te eu. Obrigado por permitir-me ensinasse-te isso.
Ao ouvir tal coisa percebi a verdadeira grandiosidade da natureza do mestre e chorando me ajoelhei aos seu pés, inclinei a cabeça e fechei os olhos.
Quando abri os olhos percebi que estava deitado em minha cama. Olhei pela janela e vi que a noite se despedia preguiçosa enquanto uma aurora dourada lentamente começava a se erguer no leste. O relógio marcava 05:07 da manhã, logo começaria mais um dia igual a todos os outros, mas eu não seria mais o mesmo. Então me levantei e fitei o espelho, tinha os olhos ainda úmidos e no peito a sensação de que recebi algo maior do que podia imaginar. Respirei fundo, acendi uma vela simples, e com a mais intensa devoção que pude extrair de meu coração... orei..."

*Drol Redaj

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